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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Com Alberto, no congestionamento

O código brasileiro de trânsitro  proibe o cidadão comum de dirigir enquanto fala ao celular, mas não o proíbe não dirigir enquanto não escreve um poema ou uma prosa poética. E é isto que estou não fazendo neste exato instante: estou não dirigindo porque à minha frente os demais veículos não andam. E consequentemente, eu também não ando. Não dirijo. Na Marginal Pinheiros. Em São Paulo.

Cem metros ou mais à minha frente está a Ponte Estaiada. Imponente. Mas carente de significado.

No canteiro central da avenida, aí sim está o que eu observo. Vejo, neste inverno esquisofrênico da cidade de São Paulo, árvores de folhas verdes e árvores desfolhadas cujas silhuetas se destacam contra o tom azul acinzentado tão pacientemente pintado, nas últimas décadas, pelos escravos anônimos da indústria automobilística, entre os quais só não me incluo por que, embora preenchendo os requisitos todos para a escravidão, me falte o único necessário para o anonimato.

Mas o que interessa, neste momento, não é a servidão nem o desconhecimento: são as árvores de folhas verdes e as árvores desfolhadas. Na percepção que tenho agora, as árvores desfolhadas, a desenhar seus contornos ocres sobre o céu azul acinzentado, estão mais belas que as árvores de folhas verdes. O porquê disso é que eu não sei; é o que me desafia na busca por um significado. Até que o estalo - Ah! Divino Estalo! - torne tudo mais compreensível, tudo, por dizer assim, mais verde:

- As árvores desfolhadas são mais belas porque têm a esperança de um dia se tornarem verdes!

Mas, neste instante, Alberto, que até então sequer me fizera lembrar de sua presença na maleta, ouviu meus pensamentos e interrompeu!

- Por que insistes tanto nos significados? Por que não te conformas com a beleza que vês e inventas uma beleza que não existe? Não é suficiente que a árvore desfolhada esteja, por hora, com esses contornos que te encantam, exatamente por estar desfolhada? Não te conformas com o que vês? Que a árvore de folhas verdes, por estar com as folhas verdes, não é nem mais feliz nem mais triste, mas somente mais verde? Por que inventas valores? Quem te disse que as árvores de folhas verdes são mais felizes?

E assim foi que Alberto me despertou do estalo, sem nada me responder. E com suas perguntas todas, me fez adivinhar uma verdade que, de tão magnífica, me arrepia...

Mas cheia de significado.

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